sábado, 28 de janeiro de 2017

NARRATIVA DA HISTÓRIA - Ciência ou Literatura?

NARRATIVA DA HISTÓRIA
Ciência ou Literatura?[1]


“A narrativa histórica implora por uma unidade entre passado, presente e futuro, na tentativa constante de instaurar ordens ao caos”
Autor Desconhecido


Paulo Ricardo Pimenta da Cruz
(Graduado em Licenciatura em História na UEG, Campus Jussara – Currículo Lattes: lattes.cnpq.br/3282710796114586)



Introdução

Existem muitos pesquisadores que se ocupam da teoria da história para discutirem se a História é ou não é uma ciência. Outros simplesmente ignoram essa discussão. Estudos apontam que diversos intelectuais ao se submeterem ao processo de construção da Historia, tem apresentado suas pesquisas tentando trazer respostas a estas indagações.
Dentre esses intelectuais, a princípio convém trabalhar com Arthur Assis, Durval Muniz e Jörn Rüsen, pois são pesquisadores de grande importância dentro do assunto que neste texto se pretende discutir.
No caso, em relação a Arthur Assis, bacharel licenciado em História pela Universidade Federal de Goiás, professor de teoria e metodologia na Universidade de Brasília, que concluiu seu pós-doutorado em 2009, pode-se dizer que tem vários textos publicados, entre eles, “A teoria da história de Jörn Rüsen: uma introdução”, que tem como objetivo o estudo da teoria da história proposta por Jörn Rüsen.
Segundo Assis, o pesquisador Droysen do século XIX teve forte influência na formação intelectual de Rüsen, precisamente porque almejava uma especialidade para a História, visto que a mesma precisava de um método capaz de ser aplicado na cognição empírica: “compreensão mediante pesquisa distanciando-a da filosofia” (ASSIS, 2010, p. 09).
Sabe-se que entre 1900 a 1940 tem surgido intensificadamente vários métodos e teorias da história que são diferentes das apresentadas por Droysen no século XIX. Mediante essas mudanças, segundo Assis, Rüsen apresenta como que atualizações da teoria de Droysen, construindo o conceito “matriz disciplina da ciência histórica” visando responder a essas transformações, como a ampliação dos objetos de estudo da História sem a protagonização do Estado e a virada linguística caracterizada pela crítica aos positivistas (objetivismo) sendo isso, um importante esclarecimento argumentativo por parte de Assis em relação à postura intelectual de Rüsen.
Ao fazer a leitura do próprio texto “Razão Histórica” de Rüsen, percebe-se que o mesmo possui domínio do argumento que utiliza, pois defende que a história é uma ciência. Rüsen traz várias contribuições para a construção do pensamento histórico, além disso, ele elenca discussões acerca da consciência histórica e a importância da narrativa na sua formação.
Segundo Rüsen, a história seria uma forma particular de construir o pensamento histórico, ou seja, por meio dela, aspectos genéricos e elementares da vida humana ganham sentido. O pensamento histórico seria analisar sistematicamente como acontece essa relação entre esses aspectos e como eles se auto-interpretam, pois se tratando de ações humanas, é considerável destacar que a mesma é efetivada visando uma finalidade, uma intenção.
Já Durval Muniz, em seu texto “História – a arte de inventar o passado” traz outros argumentos diferentes sobre a concepção de história. Para ele, o termo “invenção” é um grande conceito a ser desenvolvido teoricamente. Durval faz uma importante problematização acerca do trabalho do historiador quando propõe a ideia de que na narrativa pode haver momentos de ruptura, censura, ou de inauguração de algo antes não mencionado, pois “[...] a história é viagem que conecta e mistura tempos e espaços, que interpenetram coisas e representações, realidade e discurso, razões e sentimentos, matéria e sonho [...]” (ALBUQUERQUE JR, 2007, p. 29).


Narrativa da História


Segundo Assis, Rüsen da muita importância à forma de narrativa, ou seja: a forma como o texto é estruturado, pois segundo ele, a narrativa histórica e diferente da literária, devido possuir certa especificidade em produzir ou identificar[2] o sentido das ações humanas, vinculadas a experiências e ao cotidiano, mostrando que existe relação entre escrever e pesquisar. Para tal, ele relata seus cinco princípios: carências de orientação, perspectivas diretoras da interpretação histórica da experiência do passado, métodos de pesquisa empírica, formas de apresentação e funções de orientação, procurando explicá-las de forma separadas, porém interligadas, mostrando que na representação narrativa orientada existe uma continuidade temporal.
Segundo Assis, Rüsen diz que as motivações desencadeiam pesquisas capazes de orientar a vida prática por meio da extração de sentido das ações passadas: experiências, que sendo aplicadas a vida cotidiana, possibilitam o despertar de uma identidade. Essas pesquisas não são totalmente objetivas, possuindo tendências ao subjetivismo. Com isso, nas narrativas orientadas é possível perceber como acontece essa relação do produtor com sua produção em relação ao seu tempo. Essa orientação ocorre por meio da produção de conhecimento vinculada a critérios de verdade da ciência histórica para ter validação. A função da orientação seria percebida pelo fato do conhecimento estar sempre em mudanças, assim conhecê-lo permitira o individuo assumir uma postura. Fica claro uma preocupação em relação ao balanceamento entre objetividade e subjetividade e suas implicâncias na orientação da vida corrente.
Analisar categorias e conceitos dentro do pensamento histórico constitui fator de grande peso informativo devido possibilitar a compreensão ou interpretação do passado, ora com características gerais, ora com feições peculiares por indicarem fluxo temporal inter-relacionadas entre si. Para tal, precisam se apropriar de um método, que de acordo com Assis, Rüsen chama de “Método Histórico”.
Rüsen apresenta três fases referentes ao método histórico, como a importância das carências de orientação surgida no presente, pois são elas que norteiam a pesquisa, juntamente com as perspectivas que direcionam o olhar do historiador a tomar certa posição referente seu objeto de estudo e uma análise das informações, fontes, tendo como base a “heurística, crítica e interpretação”, ambas conectadas a historiografia. Além disso, existe outra discussão relacionada á hermenêutica e a analítica em torno do qual seria a melhor forma de se estudar o passado reconhecendo que o mesmo não pode ser alcançado tal qual como aconteceu, no entanto, para Rüsen, as duas são importantes por reforçarem a racionalidade.
Enquanto a hermenêutica observa a construção de sentido das ações humanas e suas possíveis interpretações do passado, a analítica busca entender onde e quando se forma as conexões de efeito do agir humano com circunstancias exterior, no entanto, Rüsen apresenta uma terceira alternativa: a dialética, pois possibilita relacioná-las. Rüsen dá primazia para a hermenêutica, pois por meio dela é possível promover uma espécie de diálogo na pesquisa histórica entre as possíveis carências e intenções do agir e sofrer humano em se tratando de experiência humana.
Segundo Rüsen, a História é uma área disciplinar específica dentro do amplo campo do saber. A História constitui-se um pensamento histórico em particular, pois sofre uma forte tensão entre as experiências e intenções do homem no tempo. Por ser um campo do saber, e possuir seu próprio campo teórico-metodológico, esta por sua vez, carrega em si mesma a sua própria historicidade, sua própria razão, sendo responsável pela construção da consciência histórica.
Para Rüsen, a História é capaz de orientar a vida prática do homem. Essa orientação aconteceria por meio da narrativa histórica que traz o sentido de continuidade, que por sua vez, precisa rigorosamente possuir validade científica, controle metódico e veracidade. Por meio dos argumentos de Rüsen, percebe-se que a história se tornou parte do objeto da História, ou seja, a narrativa entrou em discussão.
Mas o que seria a narrativa? Segundo Rüsen, a narrativa é uma prática interpretativa da experiência temporal. De acordo com Rüsen:

o pensamento histórico, em todas as suas formas e versões, está condicionado por um determinado procedimento mental de o homem interpretar a si mesmo e a seu mundo: a narrativa de uma história. Narrar é uma prática cultural de interpretação do tempo, antropologicamente universal. A plenitude do passado cujo tornar-se presente se deve a uma atividade intelectual a que chamamos de “história” pode ser caracterizada, categorialmente, como narrativa. A “história” como passado tornado presente assume, por princípio, a forma de uma narrativa. O pensamento histórico obedece, pois, igualmente por princípio, à lógica da narrativa (RÜSEN, 2010, p. 149).

Certamente a narrativa da história pode ser abordada como um modelo teórico explicativo, ou seja, como um paradigma dentro deste campo disciplinar que lida com a construção do pensamento histórico. Além disso, por meio do estudo sobre a narrativa da história, o historiador consegue compreender o processo empregado na construção do pensamento histórico, e da própria noção do tempo e de ciência.
Sabe-se que a narrativa é uma prática cultural interpretativa da experiência temporal. É o mecanismo utilizado para produzir história. Para Rüsen, a narrativa tem um papel muito importante, pois ela pode orientar a vida prática porque ela lida com o pragmatismo, ou seja, com as operações mentais cotidianas, como por exemplo, atos de fala, entre outros. O discurso é uma das formas de narrativa, por exemplo, existe um livro “Análise de Discurso – princípios e procedimentos” de Eni P. Orlandi, publicado em 2007, que trás uma análise profunda do discurso, mas esta reflexão por se tratar de um debate muito amplo e complexo poderá ser abordada em outro trabalho. Este livro pode ser consultado por todos aqueles que desejam aprofundar seu conhecimento sobre a composição do discurso histórico, algo que certamente facilitará compreender o que Rüsen denomina de “atos de fala”.
É interessante observar que a narrativa é uma construção cultural da experiência humana, ou seja, a forma como ela acontece possui suas peculiaridades em cada sociedade, em cada tempo. É importante observar que para compreender a narrativa é necessário estudar o tempo em que ela foi construída, mas o que seria o tempo?
Santo Agostinho disse: -“Se não me fizer a pergunta eu sei, se quiser explicar, para quem me perguntar já não sei”. Falar sobre o tempo é algo bastante complicado, mas com base nos argumentos de Rüsen, sabe-se que o tempo é algo mais amplo, não podendo ser marcado pelo relógio, porque não existe sistema de medição para ele. O relógio marca um tempo construído pelo homem, um tempo que envolve a percepção do movimento, mas antes do homem existir já existia um tempo anterior que perpassa a existência humana, ou seja, mesmo que o homem não tenha ciência da existência do tempo, o mesmo existe.
O que seria o tempo? O tempo é o tudo, ou pelo menos um conceito geral, do qual todos os tempos se originam. O tempo é um fluxo, contínuo, infinito, construtor, destruidor, além disso, também pode ser visto como o impedimento do agir humano. Compreender isso é algo muito importante, pois o tempo influencia a concepção de narrativa. O tempo histórico que Rüsen aborda em seu texto seria como que uma derivação, uma especificação ou fragmentação do tempo geral, além disso, existe aquela concepção de tempo natural que seria aquele que sofre perturbação nos seus processos, ex. morte, ligado ao tempo vivido, cronológico. Já o tempo humano perpassa a existência de uma vida humana, ou seja, seria o tempo das ações humanas que perpassam a existência do próprio homem, tempo da consciência, no qual se encontra os vestígios e rastros da humanidade.
Como a História, enquanto disciplina, se ocupa da história da humanidade[3] para orientar a sua vida prática, e é capaz de lidar com o tempo, a mesma deverá possuir uma narrativa que tenha critério de validade, veracidade, e confiabilidade. A mesma precisa possuir métodos, estética, uma forma diferente, ela precisa ser científica, ou seja, não pode perder de vista sua racionalidade, sua coesão interna. Sabe-se que para:

a narrativa histórica é decisivo, por conseguinte, que sua constituição de sentido se vincule à experiência do tempo de maneira que o passado possa tornar-se presente no quadro cultural de orientação da vida prática contemporânea. Ao tornar-se presente, o passado adquire o estatuto de “história”. Retomando a famosa expressão de Johann Gustav Droysen, pode-se dizer que a narrativa histórica “faz”, dos feitos do passado, a história do presente (RÜSEN, 2010, p. 155).

Narrar para Rüsen seria “proceder metodicamente ao rememorar o passado humano a fim de orientar o agir e o sofrer no tempo presente”. (RÜSEN, 2010, p. 99). Assim, o ato de narrar não pode ser visto como uma mera prática linguística, porque ela é construída visando a constituição de sentido. De acordo com Rüsen,

“ciência” é entendida, aqui, no sentido mais amplo do termo, como a suma das operações intelectuais reguladas metodicamente, mediante as quais se pode obter conhecimento com pretensões seguras de validade. O pensamento histórico-científico distingue-se das demais formas do pensamento histórico não pelo fato de que pode pretender à verdade, mas pelo modo como reivindica a verdade, ou seja, por sua regulação metódica (RÜSEN, 2010, p. 97. Grifos do autor).

Em si tratando de ciência da história, percebe-se que Rüsen a considera uma:

“forma peculiar do pensamento histórico, deve ser entendida, praticada e fundamentada a partir dos pressupostos e das condições de seu mundo existencial, e não interpretada como isolada e independente dele [...]. A cientificidade da ciência da história deve ser estabelecida e descrita justamente no que tem de peculiar, que produz o constructo significativo chamado “história”. [...] Por esse motivo, a abordagem da cientificidade da ciência [...] tem de ser precedida pelo exame da base existencial dessa ciência (RÜSEN, 2010, p. 96).

É interessante notar que Rüsen trata a disciplina de história como sendo uma ciência. Sendo assim, o historiador seria um cientista que lida com as ações dos homens no tempo, mas existem outros pesquisadores que não compartilham da mesma ideia rüseana. É o caso de Durval Muniz de Albuquerque Jr.
Para Muniz, a “história possui objetos e sujeitos porque os fabrica, inventa-os, assim como o rio inventa seu curso e suas margens ao passar” (ALBUQUERQUE JR, 2007, p. 29. Grifo meu). Durval expõe no seu texto um novo conceito: invenção. O mesmo é muito importante para o ofício do historiador, pois em se tratando de narrativa, algo “inventado” ou “novo” dependendo do seu grau de veracidade e de suas pretensões de verdade, pode indicar a sua falsidade ou o preenchimento de alguma lacuna do conhecimento.
É interessante observar os argumentos de Durval Muniz porque ele transpõe uma nova forma de pesar historicamente o passado e apropria noção de história. Para Durval o “termo invenção, portanto, também remete a uma dada ruptura, a uma dada censura ou a um momento inaugural de alguma prática, de algum costume, de alguma concepção, de evento humano”. (ALBUQUERQUE JR, 2007, p. 20).
Durval busca demonstrar que o historiador é capaz de trazer algo novo, uma contribuição diferente. Mas em si tratando de um evento histórico, até que ponto a narrativa do historiador pode ter sido inventada? Uma das principais diferenças entre Rüsen e Durval reside na concepção da narrativa.
Enquanto para Rüsen, a narrativa histórica está ligada a ideia de ciência da história. É uma prática cultural de interpretação das ações do homem no tempo, que precisa possuir métodos e veracidade de seus argumentos; para Durval a narrativa é um procedimento utilizado pelo historiador, de forma que possa se aproximar de uma dimensão ficcional, poética e metafórica.
O conceito que Durval aborda: “invenção”, traz um sentido de descontinuidade da produção histórica. Isso se contrapõe aos argumentos rüseanos, pois a narrativa histórica, para Rüsen, precisa ter uma continuidade, pois tem a função de orientar a vida prática.
Enquanto para Rüsen a história é uma ciência, porque possui razão história medida pelos critérios de verdades, fazendo do historiador um cientista; para Durval a história “inventada” pode ser ficcional, metafórica, o que indica que a história para ele é apenas uma prática cultural que vai de encontro com as transformações políticas, não sendo necessariamente uma ciência.
Durval também trabalha com as concepções de tempo, para ele:

escrever história é também medir temporalidades, exercer a atividade de tradução entre naturezas, sociedades e culturas de tempos distintos [...] o historiador tem a tarefa de construir com sua narrativa uma canoa que possa mediar, fazer se tocar as margens do passado e do futuro [...] ao invés de ser um profissional que fica preso ao passado, que remói suas lembranças, que fica ancorado à margem da memória e da tradição, o historiador é alguém que tem a tarefa de se descolar desta memória cristalizada, de fazer com que esta retorne ao fluxo temporal, que se liquefaça para que novamente possa correr na direção do futuro. [...] vivemos uma época em que apeamos da canoa daquela historiografia que era escrita em nome de um futuro, que despreza o presente (ALBUQUERQUE JR, 2007, p. 33).


Conclusão


Além dos autores mencionados, existem muitos outros que se ocupam da teoria da história. Responder a pergunta do título deste trabalho: Narrativa da história. Ciência ou literatura?, trata-se de um debate crítico que há muito vem sendo prolongado. Como foi visto, para Rüsen a história é uma ciência; já para Durval a mesma pode ser uma literatura. A diferença entre os autores está, em parte, centrada na sua concepção de narrativa, no qual para um ela precisa ser metódica com rigoroso critério de veracidade, já para o outro a mesma pode significar ruptura da continuidade, pode ser uma história inventada, metafórica. Se a história é ciência ou não, acredito que cabe:

ao historiador, profissional do presente e não do passado, como dizia Bloch, construir em suas narrativas a medição entre tempos e diferenciar, como dizia Kant, o que é atual, o que é próprio do nosso tempo, do que é apenas contemporâneo, o que está do nosso lado, mas vem de outros tempos, e talvez intuir, abrir a possibilidade de horizontes outros para o futuro (ALBUQUERQUE JR, 2007, p. 33).

Enfim, cabe ressaltar que a verdade nunca é alcançada em História, nem por isso, a história é mentira, ou seja, não é possível determinar a origem de um fato histórico, apenas seu limite epistemológico é encontrado, ou melhor, é determinado pela comunidade científica dos historiadores. Segundo Durval:

exerço um ofício conforme regras que não são apenas estabelecidas por mim, coerção do grupo, regras que se modificam com o tempo, mas sorrio porque sei que, apesar de tudo isso, eu participo ativamente das intenções que faço. Ao escrever história tenho atuado, agido, produzido fatos, eventos com repercussões sociais e culturais. Sou, às vezes, como um rio, mero objeto de fluxos, de processos, de relações que passam por mim (ALBUQUERQUE JR, 2007, p.35).

Portanto, a leitura de ambos os autores destacados nesse trabalho, possibilita a compreensão panorâmica de várias noções nítidas e críticas no âmbito geral e particular da formação do pensamento histórico, que podem sabiamente nortear o trabalho do historiador, sendo de suma importância para a formação intelectual de graduandos em história como também nas demais ciências históricas.
Cabe ressaltar que este trabalho é uma pesquisa sobre alguns aspectos importantes dentro da teoria da história, ou seja, ao trazer prévios esclarecimentos de Rüsen por parte de Assis, e propor uma discussão entre Rüsen e Durval, na verdade foi estabelecida uma discussão sobre os fundamentos da ciência histórica, que há muito vem sendo fermentada por diversos intelectuais, ora aprimorando, ora refutando ou reformulando seus aspectos no decorrer do tempo, sendo por si só, um processo histórico carregado de sentido capaz de orientar a vida prática por meio da construção do pensamento histórico. No entanto, o presente trabalho está longe de apresentar uma verdade derradeira, até mesmo porque a mesma não existe, ou seja, apenas foram trabalhados poucos elementos se comparado a gama de conhecimento adquirido pelo campo disciplinar da História ao longo do tempo.


Referência Bibliográfica


ALBUQUERQUE JR, Durval Muniz de. História: a arte de inventar o passado. Ensaios de teoria da história. Bauru, SP: Edusc, 2007. p. 19-36.

ASSIS, Arthur. A teoria da História de Jörn Rüsen: uma introdução. Goiânia: UFG. 2010.

ORLANDI, Eni P. Análise do discurso: princípios e procedimentos. 7ª Ed. Campinas, SP: Pontes, 2007.

RÜSEN, Jörn. Razão Histórica: fundamentos da ciência histórica / Jörn Rüsen; tradução de Estevão de Rezende Martins. – Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1ª reimpressão, 2010. p. 53-161.





[1] Este texto foi elaborado em 2014 para fins de avaliação parcial da disciplina de Teoria da História II, do 3º ano do curso de Licenciatura em História, da Universidade Estadual de Goiás, Campus Jussara – GO. Mantive sua originalidade.
[2] Produzir refere-se ao próprio trabalho dos historiadores e identificar relaciona-se a compreender algo que já esta dado, ambas as ações, seja o dado do passado como também as produções do presente são dotadas de sentido.
[3] Não me refiro a uma história antropocêntrica, no qual o homem aparece isolado do meio em que vive. Refiro-me a uma história biocêntrica, ou seja, que lide com as ações dos homens no tempo, mas que não ignore a influencia do seu meio natural.

Discurso de Formatura


UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS
CAMPUS JUSSARA

DISCURSO DE FORMATURA

Turma: Licenciatura em História (2012-2015).
Autor: Paulo Ricardo Pimenta da Cruz

Boa noite. Nesta oportunidade, quero parabenizar a todos os formandos que aqui se encontram. Quero cumprimentar também a mesa diretiva, administrativa e aos convidados que se fazem presentes. Estive pensando em casa, sobre o que deveria falar. Refleti algumas frases de efeito, termos comoventes, mas optei por falar-vos naturalmente, com sinceridade e simpatia.
Meus amigos, hoje se concretiza uma importante conquista em nossas vidas, que é a conclusão de um curso superior. Mesmo antes de 2012, desejávamos estar nesse lugar: nossa formatura. Para muitos, isso se trata de um sonho realizado, capaz de trazer mudança de vida, melhores empregos, novas oportunidades. Devemos ressaltar que antes, andávamos em direções diferentes. Mas nossa jornada individual se esbarrou aqui, e a partir desse instante, começamos a compartilhar, uns com os outros, as nossas experiências de vida. Na companhia de vocês, a jornada se revelou um caminho menos solitário, muito mais prazeroso e feliz. Pois bem, demos o primeiro passo, cientes de que estávamos olhando para um alvo relevante.
Desde o momento em que adentramos na universidade, começamos a pensar sobre a nossa razão de ser, enquanto profissionais da educação, a refletir também sobre as nossas possíveis contribuições para a construção de um mundo melhor. Foi um esforço contínuo, uma caminhada delicada, diria até, uma viagem em que muitos começaram, mas poucos chegaram até ao fim. Quantas vezes passamos noites e mais noites enclausurados em nossos quartos, lendo diversos artigos e livros científicos para construirmos um conhecimento confiável? Quantas e quantas vezes deixamos de ir a uma festa, a uma reunião de família, para termos o tempo necessário para elaborar um bom trabalho, para fazermos uma boa pesquisa, uma adequada apresentação? Nós sabemos que foram vários momentos assim.
Escolhemos isso. Fizemos a escolha, de sermos profissionais da educação. Todos os nossos esforços culminaram onde agora nós estamos, na nossa formatura. Com certeza, chegamos a uma importante etapa de nossa vida, mas essa realização não se limita a benefícios próprios, pois se expande consideravelmente para a sociedade. Nossas responsabilidades também aumentaram grandemente. Quem somos nós? Hoje somos professores, licenciados em História. Temos em mãos um poder silencioso, capaz de mudar a vida das pessoas. Temos a profissão de ensinar a sociedade a pensar historicamente o seu passado, a refletir o presente e também a projetar o seu futuro. Temos a função de promover aos nossos cidadãos, uma compreensão mais sadia dos acontecimentos humanos, isto é, sem preconceitos, racismo, manipulações políticas e distorções teóricas.
Percebemos que o mundo está passando por constantes crises, e aprendemos na universidade que uma educação de qualidade pode ajudar a sanar a todas elas. Então, o que queremos ser? Onde pretendemos chegar? Não podemos ser obsoletos. Completamos hoje o primeiro ciclo de nossa formação, mas devemos sempre lembrar que é preciso atualizar constantemente os nossos saberes científicos e práticos. O conhecimento histórico muda com o passar do tempo, e com ele também mudam as verdades, os valores culturais e a própria sociedade humana, que se renova em um ciclo infindável travado entre a vida e a morte.

Hoje, com certeza podemos dizer: valeu apena. Não foi em vão as lágrimas derramadas, as noites mal dormidas. Não foi em vão os nossos trabalhos, nossas leituras. Desistir, jamais. Persistência deve ser o nosso lema. Não pense que a vida vai ser mais leve, pois não irá. Permaneçam fortes, de cabeças erguidas diante dos obstáculos que, por ventura, possam se apresentar em nosso caminho. Não chegamos até aqui por acaso. Lembre-se dos seus objetivos e metas de vida. Se cansar, retome o fôlego e continue a caminhar. Encontraremos portas abertas, mas outras permanecerão fechadas quando batermos nelas. É preciso ser forte. Não tenham medo de ouvir um não, e além disso, não tenha medo de dizer não quando a sua integridade física e psicológica estiver em jogo. Não percam as esperanças e nem a alegria de viver. Sejam autênticos e verdadeiros diante das adversidades. Chegar até aqui, com certeza já é uma vitória, e isso é mérito seu. Com o tempo, eis que tudo se renova. Se acomodar diante das permanentes mudanças seria cometer um suicídio profissional. Diga sim para você mesmo, para seus anseios e objetivos, se permita viver novas oportunidades e, por favor, não esqueçam de viver e conviver, pois a vida é única e passa muito rápido. Temos aqui, excelentes pessoas, ótimos profissionais e bons amigos. Acreditem em seus potenciais e continuem na caminhada rumo a uma educação de qualidade, democratizada e acolhedora. Obrigado!

Um pequeno céu azul - Minha doce paranóide esquizofrênica



Acreditei que o que via era real, mas não pude tocar;
Quando minha mão estendi, num gesto de ajuda, um socorro pedi;
Não havia sol, ou como acenavam, a luz se apagou;
Quis duvidar, mas me disseram que o "não" era afundar;
Procurei entender, mas era um;
Preciso viver;

Não havia estrelas. Me perdi ao olhar para cima e ver o chão;
Detestei saber que mesmo sem querer, ganhei um céu.
A voz foi ouvida por um pequeno ser, que entre os mundos, manipula o tempo;
Cinzas, o que sobrou? Saudades do lar.

Era bom flutuar, e não sentir o pertencer.
Odeio sentir falta de habilidades que sinto tão presentes.
Como acessar/recuperar?

Não são as mesmas leis. Havia um lugar melhor.
Havia vida aqui, o que houve?
Punição? O esquecimento, o bloqueio, abandono, o silêncio já foram de mais;

Essa barreira já está fraca, a realidade se foi para o exílio;
Que mundo vivo? Limitado, não enxerga nada além do véu;
Confusão!

Andar em círculos em relapsos do que podia ser;
Está ai, bem à frente, mas porque o silêncio?
Sinto as palavras, mas não as entendo. Qual é a mensagem?

Longe de casa. Saudades da vida;
Ei! Aqui! Onde estou? Nesse céu há inferno! Me tire daqui.
De volta ao lar...

Autor: Paulo Ricardo Pimenta da Cruz
Imagem retirada do Google

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Cronologia do Tempo: acontecimentos africanos



CRONOLOGIA DO TEMPO

HERNANDEZ, Leila Maria Gonçalves Leite. África na Sala de Aula: Visita à História contemporânea. São Paulo: Selo Negro, 2005. p. 45-69.



Século XV – Marcou fraca presença de portugueses nas margens do Índico.

Século XVI – Momento de forte escoamento de escravos do ocidente africano, além de cobres e marfim.

Século XVI – Momento em que a região ocidental da África se transforma em centro de produção e circulação de escravos.

Século XVIII-XIX – Grande procura no continente africano por novos eixos de entrada no interior do território, desencadeada por franceses e ingleses, entre outros, procurando satisfazerem seus desejos econômicos.

Século XIX – Marcou declínio do tráfico escravo e início do processo de roedura do continente africano. Foi um momento de grande influência da religião para o continente africano, onde vários potentados africanos estavam se tornando presas fáceis diante dos diversos tratados que assinavam com os europeus, facilitando o colonialismo de seu território. Isso refletiu nos 226 tratados assinados com a França e nos 389 assinados com a Grã-Bretanha.


1430 – Expansão inicial do processo de “roedura” do continente africano que seria ampliado momentos após a Conferência de Berlim.
1434 – Chegada dos portugueses ao Cabo Bojador.
1455-1456 – Momento em que Cadamosto (veneziano a serviço de Lisboa) e Diogo Gomes (português) chegam no rio Gambia e em regiões da costa ocidental africana. Ainda em 1456 chegaram no rio Grande, próximo do império de Mali.
1482 – Construção das primeiras edificações no sul da Saara. Lugar onde se obtinha grande números de escravos.
1483 – Descobrimento do reino do Congo, ao norte da Angola, por Diogo Cão, que ao subir o rio Congo visava chegar às índias.
1487 – Momento em que Bartolomeu Dias dobra o Cabo da Boa Esperança.


1512 – Momento em que o Manicongo (senhor do Congo) se declarou cristão.
1530 – Momento em que foram tirados de Angola e de Pinda 4 mil negros.
1571 – Batalha de Lepanto. Momento em que os Turcos Otomanos dificultavam o acesso dos portugueses às terras de Tanger até a região de Safim.
1575 – Aumento do tráfico de cativos devido ao desenvolvimento do mercado negreiro nas Américas (portuguesa, francesa, britânica e espanhola).

1648-1850 – Momento em que o trabalho escravo tornou-se significativo no Brasil, comparado as outras regiões das Américas. Considera-se uma soma de 10 a 11 mil cativos transportados nesse momento.
1652 – Fundação da colônia do Cabo na África do Sul.
1665 – Destruição do reino Congo pelo portugueses.

1778 – Criação da Associação Africana, que tendo sua sede em Londres, reunia aristocratas e homens de negócios que visavam descobrir áreas interiores da África.
1785 – Momento em que o lago Vitória é contornado por Stanley, que posteriormente chegou na nascente do rio Nilo.
1787 – Fundação da colônia de Freetown para escravos libertos.
1795 – Escocês Mungo Park faz uma viagem de um ano e meio pela costa ocidental, no qual explorava a bacia de Níger.

1811 – Crescimento da exportação de cativos de Moçambique, em reflexos à retração da África ocidental.
1815 – Conferência de Berlim. Discutiam assuntos contrários ao tráfico de escravos.
1821 – Chagada de Denham e Clapperton ao Chade.
1826 – Chegada do escocês Gordon Laing a Tombuctu. René Caillé também foi com ele nesse lugar em 1827.
1830 – Momento em que teve forte participação dos missionários (anglicanos, metodistas, batistas, e presbiterianos) no processo de roedura do continente africano, pois estavam a serviço da Grã-Bretanha, e atuaram em Libéria, Costa do Ouro, Nigéria e Serra Leoa, criando vários postos missionários.
1847 – Independência da Libéria reconhecida, no entanto, recebeu o título de “semicolônia”.
1848 – Missionários católicos franceses protestam contra a escravidão. No entanto, estavam colaborando para a conquista cultural da África pela Europa.
1849 – Chegada de Livingstone à África do Sul. Chegou na costa do Índico em 1856, descobriu o lago Niassa em 1858, e chegou em Luanda em 1859.
1855 – Momento em que o alemão Henri Barth atravessa o Saara e chega na Inglaterra, via trípole.
1860-1880 – Missões nas regiões dos lagos visavam estabelecer unidades modelos voltadas para o cultivo de produtos para a exportação, pois eram contras ao tráfico de escravos.
1865-1890 – Período em que o rei Leopoldo da Bélgica queria fundar um império ultramarino, e portanto, lançou mão dos estudos estratégicos da exploração africana, para em 1868 – Fundação da congregação do espírito Santo na Tanzânia.
1875, fundar uma cadeia de postos comerciais e científicos na África central ao Atlântico.
1876 – Realização da Conferência Geográfica de Bruxelas em setembro, que visava identificar as rotas de entradas para o interior. Como Portugal foi o último pais convidado para participar da conferência, este se lançou na disputa para manter seus privilégios sobre a partilha da terra.
1877 – Hermegenildo Capelo e Roberto Ivens viajam para o Congo, e, na volta descobrem os cursos dos rios Cubango e Tohicapa. Também conheceram vários territórios da Angola e Moçambique em 1877 e 1879.
1879 – Fundação da primeira cidade euro-africana, Saint Louis no Senegal.
1879 – Maior controle político da França sobre o Egito.
1880 – Nesse momento o controle político dos lusitanos sobre o continente africano se limitava a pequenos enclaves e plataformas comerciais. Missões católicas vão do Níger até o Gabão. E até foi convocada por Portugal uma Conferência para decidir os processos de partilha da África central.
1884 – Declaração de 24 de abril formulada por Bismak, declarava a posse de terras africanas, desde o rio Orange ao rio Cunene, como protetorado da Alemanha. Segundo o autor, isso gerou um litígio que culminou na primeira grande guerra.
1884-1885 – Conferência de Berlim. Foi organizada por Bismak, além disso, a mesma servia para impor negociações diplomáticas. Reuniu França, Grã-Bretanha, Portugal, Alemanha, Bélgica, Itália, Espanha, Áustria-Hungria, Países Baixos, Dinamarca, Rússia, Suécia e Noruega, Turquia e EUA. Momento em que as fronteiras do território africano são traçadas.
1885 – Conferencia de Berlim. Segundo o autor, nesse momento foi instaurado o Estado Livre do Congo. Essas práticas tomadas entre 1876-1884 aceleraram o processo de partilha do território africano; Elaboração de tratados anglo-alemão que determinava regiões da África a estarem sob controle da Inglaterra e da Alemanha; Ata geral da Conferência de Berlim foi assinada assegurando as vantagens de livre navegação e livre comércio nos dois principais rios africanos: Níger e Congo. Também regulava as ocupações do território africano. Essa Ata possuía 7 capítulos.
·         O 1º era referente a regulamentação do livre comercio e navegação na zona marítima atlântica até o índico.
·         O 2º diz respeito às disposições relativas a proteção dos indígenas, missionários e viajantes.
·         O 3º definia a neutralidade dos protetorados dentro dos territórios da bacia convencional do Congo. Deveria permitir a livre circulação de comerciantes, desde que não transportassem munições.
·         O 4º concedia livre navegação no Congo para todos as nações.
·         O 5º também definiam livre navegação nas águas do Níger, apesar desse território estar sob soberania da França.
·         O 6º definia os princípios para as novas ocupações territoriais.
·         O 7º compreendia as disposições gerais, que previa modificações e deslocamentos de fronteiras caso fosse necessário.
1886 – Tratado anglo-alemão que determinava Zanzibar sob o controle britânico, colocando fim no monopólio do Reino Unido sob a África oriental.
1887 – Acordo que deu ensejo ao Tratado de Heligolândia, que restituiu-se Heligolândia ao domínio alemão. Isso acabou com o projeto britânico de estabelecer uma rota do Cabo-Cairo.
1889 – Convenção anglo-francesa que regulamentou a questão egípcia.
1890 – Acordo de aceitação da linha Say-Barrwa na África ocidental.
1890/1891/1893 – Definiram e manteram a ideia de que o alto Nilo devesse permanecer sob influência britânica.
1891 – Tratado anglo-português declarou Angola e Moçambique sob influência de Portugal. Ao mesmo tempo, trouxe novas definições para a dominação alemã sobre a África central.
1894 – Tratado estabelecido entre o Estado livre do Congo e o Reino Unido.
1896 – Derrota das tropas italianas pelo exército de Menelik, rei da Etiópia.
1898 – Convenção do Níger, que encerrou a partilha do território africano da África ocidental, entre França e Reino Unido.

1902 – Paz de Vereeniging, que pôs fim às guerras dos ingleses com os bôeres, confirmado a supremacia britânica na África do Sul.
1920 – Apesar da Conferência de Berlim não ter atendido aos direitos dos africanos, que eram os donos das terras, em 1920 tinha outras potencias disputando seus territórios.
1935-36 – Momento em que as tropas de Mussolini conseguiu entrar na Etiópia.


Autor: Paulo Ricardo Pimenta da Cruz
Imagem retirada do Google





segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Revolução/Revolta Praieira (1848-1850)

REVOLUÇÃO/REVOLTA PRAIEIRA NOS PERIÓDICOS ELETRÔNICOS[1]


Paulo Ricardo Pimenta da Cruz[2]

No período referente ao segundo reinado surgiram várias inquietações populares, como por exemplo, a revolução/revolta praieira que aconteceu possivelmente entre 1848 – 1850[3]. Muitos pesquisadores desenvolveram suas pesquisas sobre o assunto, tentando apresentar as possíveis causas, ou origem da insurreição, seu desenvolvimento e se desfecho histórico, portanto, o presente trabalho se desenvolverá utilizando as informações disseminadas nos periódicos eletrônicos encontrados na internet.
Com base nos textos lidos, percebe-se que a revolução/revolta praieira é comumente relacionada a ideais liberais que iam contra ao partido conservador, visto que eles queriam acabar com o poder moderador que só o imperador tinha, além de defenderem a importância do federalismo.
Segundo Odilon Nogueira de Matos, o “movimento revolucionário [..] de fins de 1848 a princípios de 1849, agitou a província de Pernambuco, conhecido pelo nome de revolta ou revolução "Praieira", em alusão ao jornal que, duma certa forma, inspirou os seus princípios —o "Diário Novo", situado à rua da Praia (MATOS, s/ano, p. 83). Isso é um importante aspecto sobre a praieira, visto que os liberais do Recife utilizavam esse jornal como meio de divulgação e suas ideias, portanto, existe esta relação do jornal com o nome do movimento retratado. Além disso, Odilon diz ser importante conhecer um pouco do contexto histórico do século XIX em que a mesma se desenvolveu, como por exemplo, o conflito com a política econômica latifundiária organizada pela aristocracia rural.
Referente ao recorte espacial trabalhado no presente trabalho: 1848 – 1850, convém ressaltar que o mesmo foi marcado por diversas inquietações políticas e sociais, principalmente em período de eleições no Recife.

É que, neste espaço de tempo, a disputa entre conservadores e liberais acabou se transformando em um sério confronto armado. Após a queda do gabinete liberal, em 1848, e a ascensão de um ministério conservador, sob a direção de Araújo Lima, os políticos liberais pernambucanos viram a estrutura de poder, que havia sido montada enquanto eles dominaram o cenário político provincial, ser desmontada pouco a pouco (SILVA, 2009, p. 31).

Em primeiro momento, percebe-se que há um conflito de ideais políticos e sociais entre os liberais e conservadores, que consequentemente culminou, em conflito armado, chamado por Silva de convulsão social, que fez as forças policiais legais/oficiais redobrarem a repressão e o policiamento sobre os recifenses. Como Silva analisou de perto os documentos policiais do período, afirma que a maioria dos rebelados capturados e presos eram homens, em sua maioria livres e nacionais e escravos, no entanto, alguns estrangeiros também acolheram o movimento. “Contudo, nem sempre era necessário que alguém fosse preso em flagrante para ganhar um repouso forçado na cadeia. Uma simples suspeita ou uma denúncia, ainda que vazia, era suficiente para tal” (SILVA, 2009, p. 34). Em relação aos escravos, a suspeição de que os mesmos pudessem “engrossar” as fileiras dos motins era maior ainda, portanto, a vigilância policial estava atenta aos desdobramentos sociais, empregando diversas táticas de repressão, como por exemplo, a prisão e o alistamento forçado.
De acordo com Marcos Carvalho (2003), existiam muitos indivíduos livres, alguns ricos e outros mais pobres, de camada subalternas que poderiam ser considerados “sedutores” dos povos, pois se empenhavam a mobilizar a população de Pernambuco e Recife a favor da insurreição praieira, entre eles, o liberal radical Borges da Fonseca. Em relação à possível origem da história da Praieira, Carvalho afirma que a literatura sobre o assunto é rica em informações, e que a mesma pode ser sentida desde o início da década de 1940, com o surgimento do “Partido Praieiro”, que era uma dissidência do Partido Liberal. Ainda segundo o autor, cabe dizer que os primeiros conflitos aconteceu devido Chicorro da Gama, apoiados pelos praieiros, elegível a presidência de Pernambuco havia ganhado a eleição, mas não pode assumir o cargo devido os Cavalcanti, importantes senadores conservadores terem anulado a eleição.
De acordo com Carvalho, inicialmente o partido liberal estaria em destaque na corte pela escolha do imperador. No entanto, com o reconhecimento do Senado e dos irmãos Cavalcanti, isso começou a mudar, ou seja, o poder foi gradativamente passado para as mãos dos conservadores, isso faria parte da “gangorra imperial” referente às eleições.

Ao assumir o poder, o governo praieiro começou a substituir os delegados e subdelegados de polícia na província, o que aumentaria imensamente o poder das suas bases locais. Em torno de 600 autoridades foram demitidas e, obviamente, substituídas por aliados dos praieiros. Houve reação e atritos armado sem várias localidades, principalmente durante as eleições, atestando satisfação de muitos proprietários com a chamada gangorra da política imperial. Com a queda dos liberais na Corte em 1848, a gangorra cairia do outro lado, recomeçando o festival de demissões. Um grupo de mais de 40 proprietários rurais ligados aos praieiros, todavia, recusou-se a entregar os cargos na polícia e a devolver as armas em seu poder. A Insurreição Praieira começou quando uma tropa foi tentar desarmar o coronel praieiro Manoel Pereira de Moraes, senhor do engenho Inhamam, em novembro de 1848. A raiz da Praieira foi esta disputa pelo poder local, principalmente pelos cargos na Polícia Civil, e secundariamente na Assembleia Provincial, nas Câmaras, na Justiça de Paz e Guarda Nacional (CARVALHO, 2003, p. 212. Grifo Meu).

Ou seja, foi um conflito “intra-elite” que ganhou forte repercussão social. Segundo Carvalho, a revolução/revolta praieira ganhou diversos nomes nos textos escritos no próprio período, portanto, é preciso tomar cuidado com a retórica dos autores e com seus antagonismos. Um dos possíveis nomes seria “Guerra do Moraes” referente a face da praieira no campo. Outro assunto discutido pelo autor seria a participação popular no movimento, que ao seu modo de ver, estaria relacionado a algumas relações de clientelismo, algumas até mesmo, insubordinadas, dificultando a coesão do mesmo, questionando assim, os limites da obediência. Além disso, Carvalho diz ao estudar as fontes contemporâneas à praieira, que as mesmas retratam os praieiros como um grupo de pessoas ligados aos rebeldes, portanto, eram classes perigosas.
Como já foi dito, tanto Carvalho como Odilon, dizem que é preciso ter cuidado com a retórica do escritos, ao observar outras fontes, pois ao questionar: “Quem era esse povo do Recife? Para os liberais pernambucanos, nele não estavam incluídos os escravos, os mendigos, os índios” (CARVALHO, 2003, p. 223), mas para a imprensa, os mesmos estavam inseridos.
No entanto, Carvalho afirma que não se pode negar a participação popular no movimento, principalmente porque o mesmo poderia gerar lucros, visto que alguns ganhavam dinheiro para compor as tropas, principalmente frente as disputas radicais encontradas nas eleições. Havia outros motivos, como:

A principal reivindicação dessa gente toda era a nacionalização do comércio a retalho. Propor a expulsão de portugueses, ou ao menos excluí-los do comércio miúdo, eram propostas nativistas que durante a Sabinada na Bahia já haviam catalisando o apoio popular. O nativismo nasceu nas Américas como um instrumento ideológico a serviço das elites crioulas, aglutinando em um nível ideal grupos sociais em condições distintas ou mesmo opostas. A construção dessa noção não implicava apenas excluir estrangeiros. O mais importante era a maneira como os demais eram assimilados. Ao amalgamar brancos, negros e mestiços livres nascidos no Brasil num bloco só, em oposição aos portugueses, o nativismo encobria diferenças mais profundas de raça, classe e condição legal. Isso sem falar no abismo cultural que separava os negros livres e libertos nascidos no Brasil, dos brancos das camadas dominantes. O discurso nativista dissolvia identidades profundamente enraizadas, colando os desiguais em face da utopia do Estado-nação provedor de direitos (CARVALHO, 2003, p. 229).

Os praieiros defendiam o federalismo, a maior participação política no comércio, entre outros aspectos listados na citação acima, portanto, apesar da forma “desconcertada” de organizar o movimento, o grupo heterogêneo de praieiros tinham interesses semelhantes e concretos, ou seja, suas buscas não eram utópicas e vazias pois tinha finalidades específicas que condizia com a realidade social do momento.
Segundo Odilon a bandeira do movimento seria:

o "Manifesto ao Mundo", de 1 de janeiro de 1849, em que se encontra a bandeira da revolta, condensada na convocação de uma Assembleia Constituinte com o objetivo de reivindicar os seguintes pontos: "1.° ) O voto livre e universal do Povo Brasileiro; 2.°) A plena e absoluta liberdade de comunicar o pensamento por meio da imprensa; 3.°) O trabalho como garantia de vida para o Cidadão Brasileiro; 4.°) O comércio a retalho só para os Cidadãos Brasileiros; 5.°) A inteira e efetiva independência dos poderes constituídos; 6.°) A extinção do poder moderador e do direito de agraciar; 7.°) O elemento federal na nova organização; 8.°) Completa reforma do poder judicial, em ordem a assegurar as garantias dos direitos individuais dos Cidadãos; 9.°) Extinção da lei do juro convencional e 10.°) Extinção do atual sistema do recrutamento. Programa avançado para a época, que surpreendeu a muitos dos próprios adeptos da Revolução, que não queriam ir tão longe (s/ano, p. 89).

Contudo, tratava-se de uma revolução/revolta liberal que tinha interesses sociais concretos, e que tinha interesses, por ora, como diz Carvalho (2003), até utópicos. Sobre a liderança da insurreição praieira, pode se dizer que:

logo abaixo de Nunes Machado ou Borges da Fonseca,havia líderes de trabalhadores especializados e semi especializados, que conduziam seus seguidores norteados por uma noção de legitimidade clara e objetiva.Para eles, o alvo imediato não era o Estado imperial, mas aqueles que consideravam aliados dos portugueses que ocupavam os empregos urbanos (CARVALHO, 2003, p. 233).

Os “insurretos” chegaram a tomar a cidade de Olinda, mas foram vencidos pelas forças oficiais do império, visto que não se mantinham unidos, pois enquanto uns se organizavam para montar guerrilhas, outros se davam aos saques, ou seja, a maneira como se “aglomeravam” deixavam muitas brechas que os oficiais souberam aproveitar para desnorteá-los em sua trajetória, sendo isso um dos motivos que os impediram de conquistar o palácio governo da província de Pernambuco, uma das mais importantes no momento.
Com base nas leituras dos periódicos eletrônicos selecionados, percebe-se que a revolução/revolta praieira é um assunto muito importante a ser analisado, pois revela aspectos importantes sobre a formação política e ideológica do Brasil. Além disso, diversos textos apontam o movimento como sendo um objeto de estudo passível de se desenvolver um trabalho de pesquisa interdisciplinar, visto que envolve várias áreas do saber científico.


Referências bibliográficas

SOUZA, Rainer. REVOLUÇÃO PRAIEIRA. Disponível em: http://www.brasilescola.com/historiab/revolucao-praieira.htm. Acessado 25/09/14.

Revolução Praieira. Disponível em: http://www.suapesquisa.com/historiadobrasil/revolucao_praieira.htm. Acessado em 25/09/14.

Revolução Praieira. Disponível em: http://maniadehistoria.wordpress.com/revolucao-praieira/. Acessado em 25/09/14.

A Revolução Praieira em Pernambuco1848-49. Disponível em: http://www.ahimtb.org.br/c3n.htm. Acessado em 25/09/14.

CARVALHO, Marcus J. M. de. Os nomes da Revolução: lideranças populares na Insurreição Praieira, Recife, 1848-1849. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbh/v23n45/16526.pdf. Acessado em 25/09/14.

MATOS, Odilon Nogueira de. ALGUMAS OBSERVAÇÕES SOBRE A REVOLUÇÃO PRAIEIRA. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/revhistoria/article/viewFile/34822/37560. Acessado em 25/0914.








[1] Trabalho elaborado em 2014 para fins de avaliação parcial da disciplina de História do Brasil II, do 3º ano do curso de Licenciatura em História, da Universidade Estadual de Goiás, Campus de Jussara – GO, sob orientação do professor Dr. Deuzair José da Silva. Texto na íntegra, sem alteração.
[2] Graduado em História pela Universidade Estadual de Goiás, Câmpus Jussara. Lattes: <http://lattes.cnpq.br/3282710796114586>.
[3] Alguns autores escreveram que a mesma se estendeu de 1848 – 1850, e outros, 1849-49, entre outros.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Antes de simplesmente ler e acreditar que tudo é verdade, reflita.


Clio, musa da História 

Toda  história processada pela humanidade até a atualidade é repleta de parcialidade. Não existe discurso neutro. Por mais que o narrador busque métodos imparciais, ele automaticamente se debruça na parcialidade de seu tempo-espaço. 

O simples fato dele buscar tais meios já revela seu posicionamento político e teórico em relação ao ''fazer história'', porque ''toda ação humana é política'' (M. Certeau). Por isso, sempre questione. Há muitas versões para um mesmo paradigma histórico. 

Não resgatamos a verdade pois a mesma é pluralista e multifacetada, dependendo diretamente do lugar de fala do narrador. Antes de simplesmente ler e acreditar que tudo é verdade, reflita.


Compreender história é muito mais que recorda fatos históricos e decorar datas. A História é viva e muda todo dia porque quem a faz e registra é  o ser humano, ser maleável e  instável por suas crenças e valores socioculturais. 

O registro que temos das memórias e experiências revela muito mais sobre ele mesmo do que o próprio assunto a que se refere. O lugar do narrador deve ser compreendido antes de refletir sua obra, pois será ele quem certamente atribuirá sentido a todas informações concatenadas sistematicamente no seu trabalho. 

Existem erros e acertos nos relatos escritos ou orais, e só saberemos discernir-los com muito esforço, com pesquisa árdua e sobrecarregada, possuindo treinada visão crítica. O trabalho de um autor conta mais sobre ele mesmo do que a história propriamente dita, pois nele está toda sua hierárquica expressão processual. 

Compreender é descostruir a verdade revelada, rasgar o erro, intencional ou não e, trazer luz às omissões. Á verdade é sempre parcial.



Autor: Paulo Ricardo Pimenta da Cruz
Imagem: retirada do Google
Fonte de inspiração: Textos de Michel de Certeau; Marc Bloch; Jörn Rüsen.